Oito famílias de agricultores da comunidade quilombo Quaresma realizaram, pela primeira vez, uma colheita de alho de cultivares livres de vírus. A quantidade simbólica de 180 quilos foi suficiente para deixar os quilombolas satisfeitos com a produção e a produtividade nunca vista no quilombo localizado no município de Setubinha, no Médio Jequitinhonha, em Minas Gerais. A colheita realizada na segunda quinzena de outubro teve dois destinos: uma parte foi distribuída entre eles e a outra, armazenada para o plantio do próximo ano.
A produtividade média alcançada foi de 29 toneladas por hectare (t/ha) e a expectativa, após o processo de cura e secagem do alho colhido, é que esse número fique em torno de 18 a 20 t/ha. A média da produtividade brasileira de 2023 ficou em 13,64 t/ha. A previsão é que em 2025, esses agricultores plantem as cultivares que tiveram melhor desempenho na unidade de observação composta por cinco canteiros de 12 metros quadrados.
O agricultor Sid Martins, um dos quilombolas contemplados, ficou muito satisfeito. “Esse alho é muito bom. A gente sempre plantou um alho antigo que era da época dos nossos avós”, conta. O trabalho que está sendo realizado no quilombo Quaresma é uma das atividades do acordo de cooperação técnica entre a Embrapa Hortaliças (Brasília/DF) e a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater/MG), firmado em 2023 com prazo de execução de 24 meses.
O projeto denominado Alho-semente livre de vírus: desenvolvimento e fortalecimento da cadeia produtiva do alho em regiões de agricultura familiar de MG tem o objetivo de apoiar e estimular ações de fortalecimento da cadeia de valor do alho para a agricultura familiar em Minas Gerais, por meio da introdução de cultivares de alho de alto rendimento.
O projeto contempla as seguintes etapas: capacitação de agricultores e técnicos em produção de alho-semente livre de vírus; instalação de unidades de multiplicação de alho-semente livre de vírus para abastecimento da produção; e instalação de unidades de referência tecnológica (URTs) para validação de cultivares.
Tecnologia: O alho-semente livre de vírus (ALV) é uma técnica que a Embrapa Hortaliças realiza em laboratório e que prevê a multiplicação in vitro e uma série de testes para eliminar totalmente os vírus e outros microrganismos nocivos na planta. Os alhos-sementes de cinco cultivares livres de vírus cultivados na URT instalada no quilombo Quaresma foram provenientes da Embrapa Hortaliças.
O engenheiro agrônomo da Emater/MG, Joel da Fonseca, responsável pelo trabalho junto aos agricultores, disse que, além das cultivares ALV, o plantio foi conduzido seguindo as orientações técnicas. E houve a participação deles em todas as etapas: preparação de solo, plantio, adubação, capina e colheita. Fonseca explica que esse envolvimento foi necessário para que o grupo aprendesse como produzir o ALV, que tem suas particularidades, como espaçamento e adubação. Ele ressalta que a unidade foi conduzida em sistema orgânico de produção.
Fonseca também avaliou positivamente esse primeiro experimento. “A gente precisava mostrar e comprovar para os agricultores que essas cultivares apresentam um resultado bem superior. Vamos repetir o trabalho no ano que vem com as cultivares que eles mais gostaram”.
Para o pesquisador da Embrapa Hortaliças, Francisco Vilela Resende, a expectativa é que esses agricultores tenham apreendido o conhecimento necessário para o plantio de cultivares de ALV, e que a partir de agora possam aumentar a área de cultivo com esses materiais.
Vilela, responsável pelas pesquisas da Embrapa nessa área, reforça que essa tecnologia é adotada tanto por grandes quanto por pequenos produtores. “No caso dos pequenos, o impacto da tecnologia é ainda maior, pois historicamente eles sempre utilizaram alho-semente de baixa qualidade, por causa de variedades bastante degeneradas e infectadas por doenças e pragas. Por isso, é comum observar a produtividade desses produtores dobrar com a adoção do alho-semente livre de vírus”, explica.
Alcance: Além de Setubinha, o projeto contempla agricultores familiares de oito municípios localizados nas regiões de Campo das Vertentes, Norte, Alto Jequitinhonha, Médio Jequitinhonha e Vale do Aço. A expectativa, de acordo com Georgeton Silveira, coordenador estadual de Olericultura da Emater-MG, é no próximo ano ampliar para três municípios nas regiões do Norte e Vale do Mucuri.
Silveira conta que os agricultores familiares cultivam mais o alho do grupo comum ou semi-nobre e, devido a degeneração do alho-semente, eles estavam tendo problemas para manter os padrões de qualidade exigidos pelo mercado. “Com isso, eles acabam migrando para o cultivo de outras culturas ou indo para outras atividades. Com esse projeto, a expectativa é reverter essa situação”, acredita.
Com o intuito de agregar valor à produção, a Emater em parceria com o Senac iniciou um trabalho paralelo de análise sensorial do alho. O primeiro passo foi trocar a nomenclatura. O tipo de alho comum ou semi-nobre, cultivado pelos agricultores familiares, está sendo denominado de alho do grupo aromático.
“A ideia é fazer a análise sensorial para a segmentação do uso em diversas preparações culinárias”, detalha. Ele acrescenta que os resultados preliminares indicam que o alho produzido pela agricultura familiar possui um diferencial gastronômico.
Produção Nacional: Em 2023, a produção nacional de alho foi de 185 mil toneladas, sendo Minas Gerais o maior produtor com 43%. A produtividade média alcançada em Minas foi de 15,5 t/ha, atrás do Distrito Federal (16 t/ha) e de Goiás (16,2 t/ha). O consumo médio de alho por habitante é de 1,8 kg. Para suprir a demanda, o Brasil importou, no mesmo período, 115 mil toneladas, principalmente da Argentina com 72,3% desse total, e da China, 22,8%.
Além do alho: Localizada a 15Km do Centro de Setubinha, a Comunidade Quilombola Quaresma é guardiã de ricas atrações culturais e naturais de Setubinha. Lugar de gente simples e hospitaleira, a comunidade abriga rios e cachoeiras encantadores, uma bela capela, paisagens deslumbrantes e tradições cultivadas por suas gerações, como as tradicionais danças do “Vilão” e do “Nove”, o grupo de Flautas “Taquara”, dentre outras tradições. Fonte: Associação do Circuito Turístico das Pedras Preciosas.
Fonte: Embrapa
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